Itabira, Hospital Nossa Senhora das Dores, 29 de agosto de 2022. Desce á sepultura, dia 30, terça-feira, o corpo de Wilson do Carmo Soares. Encerrada a missão do líder sindical e político, continuou até os 96 anos exercendo o “cargo” de conselheiro das comunidades.
As informações desta reportagem a seguir foram dadas por exatamente ele em uma longa conversa ocorrida em setembro de 1994 e depois reafirmada em março de 2003. E noutras ocasiões enquanto pôde continuar distribuindo sua simpatia.
MARÇO DE 1964
Para a história, aconteceu ontem. O presidente João Goulart é deposto e instala-se o governo militar no Brasil a partir de 31 de março de 1964. Até o início da década de 1990, o país não usufruiu mais da palavra democracia, oficialmente.
Itabira viveu intensamente esse período, principalmente porque o seu prefeito na época, Wilson do Carmo Soares, pertencia ao Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e mantinha estreitas relações com o Palácio do Planalto. Logo após a tomada do poder pelos militares, denunciado aleatoriamente por adversários políticos locais, Wilson foi preso e passou uma semana em Brasília prestando depoimentos na Delegacia de Ordem Política e Social (Dops) e na ID-4, um chamado “comando militar revolucionário”.
Em pouco tempo, o “Prefeito Operário”, epíteto que lhe fora dado pelo então presidente João Goulart, seu amigo particular, chegava a Itabira portando documentos que o liberavam para assumir o cargo de prefeito e declaravam sua idoneidade moral e política.
PERSEGUIÇÃO MANTIDA
Contudo, a perseguição política se manteve, de acordo com o próprio Wilson Soares, “imposta pelo governo do Estado de Minas, cujo governador era José de Magalhães Pinto, da União Democrática Nacional (UDN)”. “O objetivo dos adversários do petebista era embargar o atendimento a várias reivindicações da Prefeitura”, afirmou. Mesmo mantendo a sua postura correta, o prefeito Wilson recebeu o governador Magalhães Pinto e o ministro Santiago Dantas em Itabira com todas as honrarias e gentilezas.
Acostumado a pedir socorro ao presidente Jango, todos os contatos com a República foram dificultados. Disse ele: “As folhas de pagamento da Prefeitura começavam a ficar em atraso e, para dificultar, até então, a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) não pagava impostos”. A saída encontrada foi o bom entendimento com o vice-prefeito, José Machado Rosa, eleito em chapa separada.
SOCORRO MACHADO ROSA
Wilson, com 37 anos de idade em 1963, tinha sido eleito prefeito de Itabira numa eleição disputadíssima com Caio Martins da Costa e José de Oliveira Machado (Jody Machado): apenas 3 votos de frente de Jody Machado, em sufrágios contados e recontados. Para seu socorro administrativo, contava com a participação dos assessores Paulo Sampaio Guerra (Paulinho Sampaio), Saul Olavo Reis, Antônio Augusto de Campos Rosa, Nélson Lima Guimarães, Dr. Mauro de Alvarenga e Ceomar Paulo Santos. Ele acumulou também o cargo de presidente do Sindicato Metabase.
Como foi mostrado, Wilson se entendia bem com o sempre compreensivo José Machado Rosa, mesmo ele, Rosa, sendo filiado à UDN. Assim, sempre quando era necessário obter ajudas dos governos estadual e federal, o vice-prefeito era chamado, assumia e propiciava a chegada dos benefícios.
E foi assim, também, com a instituição do Imposto Único Sobre Minerais (IUM).
ADVENTO DOS IMPOSTOS
Há historiadores e estudiosos do assunto que consideram Itabira agraciada com impostos da Vale desde a sua criação, em 1942. Mas não é verdade. Durante 25 anos a velha CVRD não pagava um centavo de impostos à Prefeitura de Itabira.
Vamos a esta importante história. Em meados de 1965, já estava aprovada pelo Senado e sancionada pelo presidente da República a lei que criou o IUM. Faltava, no entanto, a regulamentação. A Prefeitura fez intensos contatos e conseguiu, finalmente, como maior interessada entre os municípios mineradores, na época, que tal matéria pudesse resolver o cruciante problema itabirano.
Mas estava muito claro: o dinheiro só sairia para um prefeito aliado da UDN. Wilson, então, preparou a sua licença e José Rosa assumiu o seu posto. A verba foi buscada e resolvido esse problema. Registrou-se aí a instituição do primeiro imposto para municípios mineradores do Brasil, cuja lei prevaleceu até a Constituição Federal de 1988, quando foi criado o royalty e outras contribuições.
A VOLTA DO OPERÁRIO
Enquanto a UDN estava no poder, Wilson Soares não quis prejudicar o município e, mesmo sendo direito seu retornar ao poder, esperou a mudança pela vontade do povo. Em 31 de janeiro de 1966, com a posse de Israel Pinheiro, do PSD, que derrotou nas urnas o candidato de Magalhães Pinto, Roberto Rezende, o operário retornou ao seu posto na Prefeitura itabirana.
A cidade recebendo alguma compensação, mesmo ainda não consideradas justas, muitas obras foram executadas durante o quatriênio Wilson Soares-José Rosa. A exemplo, dezenas de escolas, incluindo uma das maiores de Minas Gerais, Escola Estadual Mestre Zeca Amâncio (Emza), além de Américo Giannetti, José de Grisolia, Maricas Magalhães, Antônio Linhares Guerra e outras na zona rural.
Marco importante da época foi a elaboração do primeiro Plano Diretor de Itabira, que serviria, mais tarde, para direcionar vários governos e outros planos de desenvolvimento urbano.
POLÍTICO SEGUIU SEU CAMINHO
Afastado algum tempo da política, Wilson Soares voltou à vida pública em 1972, candidatando-se a prefeito pelo MDB e contribuindo com a vitória de Virgílio José Gazire. No governo Gazire, assumiu o cargo de chefe do Departamento Administrativo, que significaria hoje Secretaria de Obras.
Em 1976, candidatou-se a vereador, foi eleito, exerceu o mandato até 1982, reelegendo-se de novo e permaneceu na Câmara Municipal até 1986.
Missão cumprida no Planeta Terra e na terra natal, o povo itabirano despediu-se dele com muitas lágrimas que significam mais do que tudo, agradecimento.
O prefeito Marco Antônio Lage decretou luto oficial por 3 dias e o Sindicato Metabase, representado por André Viana, manifestou o pesar de todos os seus associados.
José Sana
Em 30/08/2022