Pode ter sido o desenho do futuro de Itabira a participação da escritora e artista plástica Rosemary Penido de Alvarenga no 50.º Festival de Inverno de Itabira, inserida na programação da tarde de 15 de julho, segunda-feira. O evento da ideia teria sido realizado no espaço da Biblioteca Pública Luiz Camillo de Oliveira Netto e contou com boa parte de intelectuais itabiranos.
Por estar muito atual e sua conotação chamar ao debate a exaustão das minas da Vale, a consagrada escritora itabirana Rosemary Penido resolveu colocar em discussão o poema “O Despertar” do livro dela própria, “Uma canção de Itabira”. Rose Penido foi incluída na quinquagésima promoção pela direção dos organizadores do festival, tendo à frente a Administração Municipal de Itabira. Isentíssima e apartidária, portanto.
DE OLHO NO FUTURO
Tema quase não discutido no festival, este muito cheio de pompas e caríssimo, considerando dimensão das contratações culturais deste ano eleitoral, a maioria de músicos de renome nacional, diria que as discussões propostas pela escritora itabirana trouxeram luz ao significado da promoção.
A promoção, de 1974, criada pelo ex-prefeito Virgílio José Gazire e pela ex-professora e ex-secretária de cultura Miriam de Souza Brandão, ambos falecidos e esquecidos durante o evento.
“O DESPERTAR”
Rosemary Penido de Alvarenga
Nosso futuro é incógnita
Como será Itabira
quando a Vale for embora?
Em breve, tudo se acaba,
pois o minério se escassa,
as prateleiras da serra
têm reflexos furta-cor.
Estamos desprevenidos;
a Vale arrumando as malas,
despedindo os empregados,
desfazendo-se dos bens.
Nossa receita maior
vem das riquezas do solo.
Foi-se o ouro, vai-se o ferro;
ficam, no chão, cangas soltas.
Ficam os buracos, o vácuo.
O fantasma de outra era
e nós, os itabiranos.
Volta o tempo perdido?
A gente sabe que não.
De repente, estamos órfãos.
E não sabemos , sozinhos
caminhar, seguir em frente.
Garimpar, novo destino
é fato primordial.
Mas qual? Não aprendemos
senão o duro trabalho da primeira vocação.
Como foi que nos vendemos
ao poder da grande empresa?
Quando foi a sedução?
Quanto tempo nos quedamos
nesse sono, assim profundo?
Quem mesmo nos despertou?
Santo Deus! Que pesadelo!
Perdemos nossa bússola
em hora de mar revolto.
A poeira cobre tudo: paisagens, horizontes.
Ir a caminho do Sol?
Viajar para o poente?
Há de se orientar,
há de se decidir,
pois o tempo não espera
e estamos à deriva.
Foi-se o ouro, vai-se o ferro.
Fica o lixo mineral
nos ferimentos da terra,
nos cortes, nas vísceras,
onde a enxurrada o levou.
Ficam a desesperança,
um sentimento de perda
e nossa perplexidade.
Foi-se o ouro, vai-se o ferro.
O silêncio restará
e o eco surdo, longínquo,
das antigas explosões.
Restará, pulsando forte,
um coração destemido,
máquina de ferro e aço
bombeando um futuro que pode
nascer das cinzas.
E, tenho fé, nascerá.
Da Redação
Fotos: Diário de Itabira