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E assim, engrenei uma marcha observadora. Entrosei-me com o dia a dia desta gente maravilhosa que compõe a família Alvarenga, da mais antiga e à atual geração. Tem de tocar a campainha para entrar? É claro, lógico, incontestável. A resposta vem logo : “Suba!”. Uma ordem expressa.

A primeira imagem aparece logo mirando o alto da escadaria. O amarelo do canário “chapinha” chama a atenção, enfeita a chegada, dando boas-vindas. O também conhecido como “cabeça de fogo” é a cereja do bolo, complementando com o preto e o branco do “papa-arroz coleira”. E vêm o sabiá, o pintassilgo, o bem-te-vi. Só falta alguém cantar o hino a Itabira.

E lá estão os personagens, sorrindo sem parar, sinal do “seja bem-vindo”: Dona Eny e Colombo. O poeta recebe-me com a famosa estrofe de Castro Alves que ele muito aprecia: “Vai, Colombo! E abre a cortina de minha eterna oficina… e tire a América de lá!” (Do livro: “Poetas Românticos Brasileiros”, vol. I, Editora Lumen, SP, s/ano).

Assento-me na cadeira de “pacientes”, por aí passaram e passam milhares de seres doentes ou não. Vem a água (velhos precisam mais que os jovens), depois o café, visitação aos vastos cômodos com a sua história que é  contada devagarinho.

A metodologia é seguida aos poucos, eles falam, o gravador registra, depois consigo alguém para transcrever, embora eu tenha aparelhos especiais para quem tem baixa audição e possa assumir a incumbência de registrar. Livros são mostrados, colocados num canto especial e fotos. Funciona a perlustrar bibliografia sobre tantos temas, conforme citações em cada capítulo.

A História Oral é o que é mais aplicada. É preciso destacar sempre que o personagem como que absorvido pelo sistema Ghost Witer, que é o autor real de toda a história. Esta tem uma característica da História Nova.

Praticamente, pelo fato de evitar ao máximo a abordagem da Escola Positivista,que segue cronologicamente aplicada e trata de algo superado em modernidade, os temas são alternados em compassos às vezes curtos, médios ou longos. Dar ao trabalho sobre um personagem de extenso currículo, longevidade provada e comprovada a devida autenticidade, torna a história um caminho de maior crédito.

As idas e vindas pela casa, incluindo o quintal de extensão enorme, mostram que o personagem parece ter previsto que um dia seria impedido de percorrer as ruas íngremes de Itabira. Se não pode mais correr, vamos aproveitar o quintal.

As narrativas do principal personagem, coordenadas também pela gentil dona de casa, Eny, valorizada em todas as citações de amor e carinho, tudo em sentido prático, são gravadas e ainda não escritas no sentido literário. Colombo não é só poeta (ele detesta que digam, apesar de prêmios que já ganhou), mas também filósofo, cantor e declamador.

Vamos, por hoje parar por aqui apenas encerrando com a criatura incomparável que é Eny Figueiredo de Alvarenga. Os pássaros atraídos ao alpendre pelo farelo que adoram e no quintal não se assustam com a personagem. Quem conta é Colombo: “Se o ambiente está em silêncio e paz, beija-flores, com suas forças de amor mostradas nas batidas de seus corações, essas mimosas aves pousam mansamente sobre ombros de Eny”.

Também o marido, atencioso e carinhoso, narra um fato recente, quando completava 101 anos de idade, no Restaurante Pesque e Pague, na estrada de contorno de Itabira: “Éramos umas 30 pessoas chegando lá e, de repente, aparece um cão, meio vira-latas, dribla pernas, cadeiras, mesas, alvarengas e garçons e se posta ao lado de Eny. Só espera Agnaldo registrar uma foto que prova a leveza da criatura”, conclui Doutor Colombo Portocarrero de Alvarenga.

 

José Sana

Em 18/07/2024

Fotos de Agnaldo

NS
José Sana, jornalista, historiador, graduado em Letras, nasceu em São Sebastião do Rio Preto, reside em Itabira desde 1966.

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    Mary Sana
    Mary Sana
    8 months ago

    Que história de vida fantástica!

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