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Reunião da Interassociação de Amigos de Bairros: salão com a presença de número médio de participantes

 Em 1966, quando cheguei a Itabira, sentia na pele os grandes problemas da cidade: saneamento básico deficiente, transporte ainda incipiente, desorganização urbana e rural completas, falta de água, energia elétrica ainda por atingir a zona rural e crescimento urbano desordenado. Caso alguém queira se inteirar de questões fundamentais de uma cidade basta procurar as obras intocáveis e perfeitas da turma que decidimos chamar  “As Três Marias”: Maria Cecília Minayo, Maria das Graças Souza e Silva (Baginha) e Maria do Rosário Guimarães de Souza (Zara).

Em toneladas de explicações, as mestres e doutoras apresentam de há muito as soluções em trabalhos científicos discutidos e aprovados em universidades de renome. Infelizmente, o esforço e a inteligência vão se envelhecendo porque os problemas se multiplicam. O poder público não vê.

ASSOCIAÇÕES EM  PESO NOS BAIRROS

Era prefeito de Itabira Wilson do Carmo Soares, originário do sindicalismo do velho Sindicato  Metabase. Em 1967, assumiu a prefeitura Daniel Jardim de Grisolia, até 1970, quando se suicidou, deixando o cargo para o vice-prefeito Virgílio José Gazire. Virgílio assumiu e promoveu eleições do chamado “mandato tampão”. Nessa disputa, entrou para valer Padre Joaquim Santana de Castro, vigário da Paróquia da Saúde, assumindo o governo até 1972.

Chegava eu ao Bairro Major Lage de Baixo a partir de 3 de janeiro de 1970, onde permaneci até 1972, mudando-me, com a família (esposa e filha), para o bairro Pará, em apartamento do BNH. Continuei militando na Associação das Famílias Unidas até ser lançado candidato a vereador.

Elegi-me para o Legislativo como o mais votado da cidade (693 sufrágios). Afastei-me da entidade comunitária por exigência estatutária da mesma, mas , no segundo mandato — 1977 a 1982 — fizemos funcionar o Plano Funil, uma forma técnica de defesa das associações de várias finalidades — de bairros, filantrópicas e de classes — que tinha moral e forças diante do poder público.

COMO SOBREVIVIAM AS ENTIDADES?

As atividades comunitárias eram intensas a partir da criação da Famílias Unidas do Bairro Major Lage de Baixo. Os principais objetivos eram sustentar a vida nos bairros com os principais problemas resolvidos.

A  antiga Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) em expansão, os desafios eram  multiplicados. Faltavam na cidade água, esgoto, energia elétrica, transporte público e até mesmo cemitério. Ao assumir, em 1973, como prefeito eleito pelo povo, Virgílio recebeu de Padre Joaquim a questão da água resolvida, com a inauguração do manancial da Pureza.

Cemitério e Estação Rodoviária vinham das últimas ações de Daniel Grisolia. As novas frentes de problemas se resumiam em habitação e o crescimento desordenado da cidade. A violência cresceu assustadoramente na criação dos projetos Cauê e Conceição, que atraíram milhares de famílias à cidade.

As associações de bairros se multiplicavam, incentivadas pela Diocese, recém-criada, que dava assistência à solução inesperada das demolições de bairros pela CVRD, como ocorreu em parte da Vila Paciência, Coração de Jesus (Explosivo) e Conceição de Cima. Outras entidades surgiram paralelamente, como foi o caso da Associação de Proteção à Maternidade e à Infância de Itabira (APMII). Nem todos os forasteiros que chegavam encontravam emprego e daí a multiplicação dos desafios. A miséria assolou grande parte dos bairros periféricos.

ASSOCIAÇÕES SE AGIGANTAM

Em encontro que coordenei em 1976, quando era presidente do Legislativo o vereador José Braz Torres Lage, havia em Itabira 75 associações comunitárias. Para sustentar tão notável crescimento, criou-se a Interassociação de Amigos de Bairros, cujo objetivo era (e continua sendo) coordenar as atividades das associações.

O sustentáculo dessas se consistia em cadastrar moradores de bairros, receber de cada residência uma mensalidade fixa e promover outras atividades com vistas a arrecadar fundos para investimentos (construção de sede, encaminhamento de cidadãos à Saúde Pública e atenção aos problemas da Sociedade São Vicente de Paulo  – SSVP).

Ocorriam eleições e os candidatos apareciam. Era vedado, de acordo com os estatutos das entidades, o apoio a algum pretendente político partidário. Nem se discutia.

Precisavam-se de verbas, não havia como buscar senão quando apareceram as organizações não governamentais (ONGs) nos anos 1960/1970. Mas em Itabira até a década de 1980 não havia recebimento de ajudas externas, senão por meio da Diocese. Na época tratava-se de reivindicações exclusivas da APMII e de outra iniciativa que surgiu, a Associação de Proteção à Infância Nosso Lar, de que participei da criação, convocado por um grupo de origem espírita.

 

A DECADÊNCIA QUE PRECISA SER DETIDA

As entidades comunitárias entraram no processo “início do fim”. E, como não poderia deixar de ser,  foram os políticos os inconsequentes da lista. Inventaram as verbas. Quem não gosta de dinheiro? Uma tentação mais que extra. O pior, dinheiro que só sai de bolsos públicos. Junto das ofertas, a “legalização” da prática totalmente nociva aos princípios que nortearam a criação das verbas públicas.

Repete-se de novo: quem não quer dinheiro? E chove dinheiro, principalmente numa cidade milionária como Itabira, onde sempre falta o fator gestão para defender os bens populares.

O que vem por aí? Associações de Amigos de Bairros estão no vermelho. Sabem que existe o dinheiro fácil vindo de órgãos públicos. O que fazem? “Eu quero um tantinho, eu quero um tanto e eu quero um tantão. Está formada a baderna. Na hora em que se precisam de votos não existe a expressão negativa. Os membros das entidades sabem que só ouvirão o “Sim” dos detentores do poder.

Mas é preciso atrair os setores competentes da sociedade para participar. Dá tristeza ir a uma reunião com meia dúzia de gatos pingados nas discutindo problemas. Não se sabe como ressuscitar uma entidade dos anos 1960/1970? Retornem aos eleitores que trabalham de graça. São milhares, mas saibam desde já, forasteiro não, ou melhor forasteiro que passe na peneira. Eu sou um forasteiro, mas consegui ser filtrado, modéstia às favas.

FAZER O QUÊ? E AGORA, GENTE BOA?

Não sou candidato a nada. Estou aí ao lado de muitos e muitos cidadãos que se oferecem para funcionar uma moderna cidadania. O que fazem os conselhos de governo? Muito pouco e até são extintos sem ninguém dar um pio, uma queixa, o Conselho de Combate às Drogas. É um problema sério na cidade. E que evitam tocar nele.

Outra questão: o Conselho de Desenvolvimento Econômico, que não existe ou, se há, não deu as caras por enquanto. Itabira parou em dois distritos industriais, ineptos, quase não notados. As sugestões, por enquanto  iniciais poderiam ser assim determinadas.

Que voltem as associações comunitárias do velho estilo, sem a infiltração de politiqueiros. Que retornem com outras forças. Que cheguem atraindo gente que ama Itabira. E venham pensando nisto: a nova Vale não quer conversa com quem só pensa em si. Queremos quem nunca mais pense em si apenas.

José Sana

Imagem: redes sociais

NS
José Sana, jornalista, historiador, graduado em Letras, nasceu em São Sebastião do Rio Preto, reside em Itabira desde 1966.

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