O que é o tempo tem sido um dos maiores enigmas enfrentados pelos filósofos desde tempos imemoriais — e, mais recentemente, pelos cientistas. Embora não sejam capazes de responder à questão — se é que ela poderá ser um dia respondida — os físicos encontraram uma maneira bem prática de lidar com ela, empregando o que hoje conhecemos como Segunda Lei da Termodinâmica.
Segundo essa abordagem, o nível de desordem do Universo — sua entropia — sempre aumenta, com as coisas ampliando seu nível de falta de organização em uma escala tal que é impossível reverter. Essa é a tal “seta do tempo”, que explicaria porque sempre vamos do passado para o futuro, e nunca de volta. E quanta gente queria que o passado se retornasse!
DESORDEM NO UNIVERSO
Esse ponto de vista acaba de receber um reforço experimental inédito, graças ao trabalho de Anna Pearson e colegas da Alemanha e do Reino Unido. Anna bolou um experimento demonstrativo de que quanto mais energia um relógio consome, ou seja, quanto mais entropia ele gera, maior será sua precisão na marcação do tempo.
Para estabelecer essa ligação fundamental entre consumo de energia e precisão na medição do tempo, Anna construiu um relógio particularmente simples, constituído por uma membrana vibrante ultrafina, com algumas dezenas de nanômetros de espessura e 1,5 milímetro de comprimento, incorporada a um circuito eletrônico.
Quando a membrana é aquecida, ela vibra, marcando o tique-taque do relógio, enquanto o fluxo completo de energia através do dispositivo é medido eletricamente pelo circuito.
O que Anna descobriu é que, quanto mais calor ela fornecia ao relógio, maior era a precisão alcançada na marcação do tempo. Na verdade, a precisão mostrou-se diretamente proporcional ao calor liberado — por exemplo, para tornar o relógio duas vezes mais preciso, é necessário fornecer o dobro de calor.
EM AÇÃO A SEGUNDA LEI
O experimento também mostra uma semelhança entre o funcionamento de um relógio e de uma máquina a vapor: assim como acontece no motor termal, há uma restrição fundamental quanto à quantidade de calor que devemos fornecer para fazer uma quantidade desejada de trabalho.
Essa restrição é a famosa Segunda Lei da Termodinâmica, que é fundamental para a engenharia moderna. E o que este experimento sugere é que os relógios, assim como os motores, são limitados pela Segunda Lei, com a distinção de que sua saída são tiques precisos, em vez de trabalho mecânico.
“A disciplina da termodinâmica, que incorpora os princípios mais fundamentais da natureza, nos diz que existem dois tipos de máquina que não podemos operar sem liberar calor. Um é o motor mecânico, que libera calor para fazer trabalho, e o outro é a memória de computador, que libera calor ao se reescrever. Este experimento — em conjunto com outros trabalhos — sugere que os relógios também são limitados pela termodinâmica. Ele também levanta uma questão intrigante: todos os relógios possíveis são limitados dessa forma, ou é apenas uma propriedade desses que estudamos?” ponderou o professor Edward Laird, membro da equipe de Anna Pearson.
REFLEXOS GERAIS
O que o experimento demonstra é que medir o tempo está sujeito às mesmas leis que fazer um motor funcionar, o mesmo que compreender o custo termodinâmico envolvido, que tem largas implicações teóricas e práticas.
Além de colocar mais uma peça no quebra-cabeças da questão sobre o que é o tempo, este resultado tem implicações diretas no desenvolvimento de tecnologias cujas dimensões se aproximam do reino quântico.
E não são só os relógios atômicos que terão que levar em conta esse eventual novo limite fundamental, mas todos os computadores eletrônicos e quânticos, para os quais temperatura de operação e precisão são fatores cruciais.
“Ao medir o tempo, estamos aumentando a entropia do Universo. Quanto mais entropia há no universo, mais perto ele pode estar de sua eventual extinção. Talvez devêssemos parar de medir o tempo,” brincou a professora Natalia Ares, coordenadora da equipe. Mas a escala da entropia adicional imposta pelos relógios é tão pequena que não há necessidade de se preocupar, acrescentou ela. Pelo menos por enquanto.
EM TEMPO
Termodinâmica é parte da Física que estuda as leis que regem as relações entre calor, trabalho e outras formas de energia, mais especificamente a transformação de um tipo de energia em outra, a disponibilidade de energia para a realização de trabalho e a direção das trocas de calor
A segunda lei da termodinâmica é um enunciado de Clausius: “É impossível que uma máquina, sem a ajuda de um agente externo, consiga conduzir calor de um sistema para outro que esteja a uma temperatura maior.
Redação do Site Inovação Tecnológica – 11/05/2021