Buraco é o mesmo em qualquer lugar do mundo e se mostra como abertura, rachadura, rasgão, fresta e outros substantivos que os dicionários de português mostram. Em Itabira revela que tenhamos adotado as crateras como se fossem seres humanos, cães, gatos, galinhas.
Entram os buracos como se fossem seres animados. Parece por aqui que a buracada tem sentimentos e almas. Vivam as nossas valas que nem fundo têm!
CRATERAS
Cratera é um convite feito diretamente à natureza do município, clara e evidentemente voltada para a origem centrada no mato-dentro. Isto é, na busca de riquezas pelos bandeirantes portugueses ou paulistas (ainda não há definição exata), ao retirar o mato aportaram-se rachaduras imensuráveis.
Aí, os orifícios destacaram-se sob o signo da cobiça e só se pensavam, em ouro, em alguns lugares em diamantes. Minério de ferro e outras riquezas deram as caras depois.
VALE E SAAE
Já foi confirmado que o maior fuçador de buracos em Itabira não é o tatu, como em outras urbes. Em primeiro lugar, a Vale, que em mil anos não conseguirá tapar as crateras que cometeu (isto mesmo, foram crimes). Suas, crateras, não, retifico, nossas. Ela vai embora daqui a pouco e nós herdaremos os orifícios. A madrasta recebeu de graça os terrenos ricos, enfiou suas perfuratrizes, tratores e escavadeiras, além das retros de escavadeiras no chão e construiu a paisagem horrorosa que qualquer um vê somente se levantar o pescoço.
Um conterrâneo nosso, por sinal, jornalista da prateleira de cima, diretor famoso de um diário muito lido, Luiz Andrade Müller, é autor da melhor frase que já li em toda a vida sobre mineração: “A fé e a Companhia Vale do Rio Doce (hoje Vale S.A.) removem montanhas”.
Os buracos minerários podem ser vistos de baixo para cima, de cima para baixo, do lado esquerdo e do direito, é bom repetir. Os classificados em segundo lugar são de autoria do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae). São, portanto, oficiais, levam quase um ano para ser tapados.
No tempo de Daniel de Grisolia, segundo testemunhas oculares, havia uma frase democrática impressa na conta de água. Era o seguinte o bordão: “A diferença entre São Pedro e o Saae é que São Pedro manda água sem conta e o Saae manda a conta sem água”.
BURACO TÉCNICO
A Itabira chique é a que adota como grande foco o conhecido “buraco técnico”. Na prática é o seguinte: a natureza o constrói com suas receitas e vem uma equipe técnica para dar andamento. Devidamente credenciada, a turma com diploma, se possível, em Harvard, constrói uma figura geométrica ao seu redor, que pode ser um quadrado, ou um retângulo, ou um triângulo, transformando-o em uma formação, no caso da demonstração triangular, no cálculo da hipotenusa, ou seja que o seu quadrado seja a soma dos quadrados dos catetos.
Aberta essa geometria, só possível aos engenheiros civis, a cavação ou escavação, pacientemente aguarda a chegada de uma outra equipe para preparar as bordas da nova fissura e deixá-la pronta para os operários, esses podem ser semileigos que tingem as beiradas da cratera de piche.
Dali a uns três meses vem um caminhão de asfalto, atrás ele meia dúzia de operários leigos com um carrinho e duas pás, além de terra extraída nas beiradas de ruas, para tapar os mais profundos e deixar o resto para o caminhão, que dá uma ré e resolve o problema.
Decorridos os três meses, esse grupo está em outras regiões e algum apontador anota o tempo necessário para que ele se afunde, ou melhor, em menos de uma semana já está ressuscitado, ou seja, voltou o seu DNA à estaca zero. Significa que a reencarnação faz parte da fisiologia da buraqueira. Para conferir, hoje, vá à Rua Mato Grosso no Bairro Amazonas ou na Rua Juca Machado, na subida da Rodoviária para o Alto Pereira. Trata-se de um exemplo apenas momentâneo.
BURACO QUALQUER
É preciso destacar que os buracos comuns, também chamados de rachaduras e gretas, representam mais de 50% do planejamento urbano de Itabira. Eles existem mais nos passeios, um lugar apropriado para quebrar pernas, braços, colunas, costelas, cabeças e ombros de velhos, velhas, crianças e deficientes.
Ninguém os defende nem os denuncia porque o povo anda agora no meio da rua para não torcer os pés. Aí são executados com mais rapidez porque concorrem com os veículos e não são emplacados. Uma sugestão seria dotá-los de números e letras para facilitar.
Considerando que a visão geral é esta, apresento Itabira com a sua real anatomia. Quem desejar, pode fazer levantamento, entrando mais profundamente em buracos de tatus que ornamentam Itabira de ponta a ponta. Podem encontrar, por aí, também o que está se tornando mais comum, além dos currais que fecham os passeios aos pedestres, os “buracos de estimação.
Cabrito/José Sana
Em 03/06/2023
Imagens: NS e Redes Sociais