0

Thyago Henrique

Repórter

Minas Gerais busca alternativas à dependência da mineração

Com a mineração em contagem regressiva, municípios mineiros enfrentam o desafio de reinventar suas fontes de riqueza | Foto: Reprodução Adobe Stock

Embora a mineração seja a marca identitária de Minas Gerais e o motor de riqueza do Estado desde os primórdios, durante o ciclo do ouro, os recursos minerais são finitos. Quando os recursos se esgotam, os municípios que cresceram à sombra da atividade mineral e não desenvolveram alternativas econômicas sustentáveis entram em colapso.

Para evitar a ruptura financeira, a cidade de Itabira, na região Central, berço da extração de minério, corre contra o tempo para diversificar sua economia, ainda sustentada em 80% pelo setor. O esgotamento das reservas de minério de ferro da Vale no município está previsto para ocorrer daqui a 16 anos, em 2041. Mas esse é apenas um dos exemplos.

Não é somente a exaustão mineral que pode levar municípios dependentes da mineração à ruína. Essas cidades estão sujeitas às oscilações do mercado, que impactam a arrecadação da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem); às decisões corporativas de interromper ou encerrar empreendimentos; e até mesmo a eventos extremos que comprometem operações, como nos casos das tragédias de Mariana e Brumadinho.

“Não devemos colocar todos os ovos na mesma cesta”, resume o professor de Ciências Contábeis da Estácio BH, Alisson Batista, destacando a importância de uma diversificação de fontes de investimento e receita em prol da redução da dependência do setor mineral.

“Apesar de a mineração ser bastante duradoura, ela é finita: não vai ter minério ali para se retirar o resto da vida. É importante que o município pense em outras vertentes”, ressalta. “Em Barão de Cocais, por exemplo, uma vez finalizadas as principais jazidas, fechou-se a mineração, parte da população teve que se deslocar e ficou com uma renda bem menor”, completa, citando o fim das operações da Vale na Mina de Gongo Seco, na década passada.

Estado está no caminho, mas ainda é preciso avançar

Na avaliação de Alisson Batista, a diversificação econômica dos municípios passa por uma união entre poder público e empresas, e não é algo que acontecerá de imediato. Para ele, Minas Gerais está caminhando bem para atingir esse objetivo; contudo, ainda precisa progredir.

Alisson Batista
Alisson Batista, professor de Ciências Contábeis da Estácio BH | Foto: Divulgação Acervo Pessoal

Batista destaca que o Estado tem várias riquezas que podem ser exploradas pelo turismo. O professor afirma que plantar a semente de negócios secundários nos territórios pode ampliar a possibilidade de receita dos municípios cuja mineração é a maior fonte de riqueza.

“Minas está no caminho, mas ainda é preciso mais investimento e desenvolvimento”, diz. “Se o governo não se posicionar e cobrar das empresas, não vamos avançar mais”, pondera.

Visando diversificar a economia de Minas Gerais, a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico (Sede-MG) informa que dispõe de ampla gama de ações. Entre elas, estão o apoio aos Arranjos Produtivos Locais (APLs), o programa de desburocratização Minas Livre para Crescer e a atração diversificada de investimentos.

“A título de exemplo, a presença de 72 APLs [reconhecidos em 309 municípios] ressalta os diferentes segmentos produtivos que contribuem para a economia mineira, desde áreas especializadas na produção de vestuários até em biotecnologia”, destaca.

“A desburocratização de processos para o surgimento de novas empresas também enfatiza que Minas se tornou um estado atrativo para os empreendedores que desejam iniciar suas operações em território mineiro. De janeiro a maio deste ano, quase 50 mil novos negócios foram formalizados”, sublinha a pasta, mencionando ainda o fato de o valor das exportações do agronegócio ter ultrapassado, pela primeira vez, em 2024, o alcançado pela mineração.

Minas Gerais é afetada pela “maldição das commodities”

As glórias do passado não justificam os erros do presente, nem garantem o sucesso do futuro.” A frase, comumente dita por Otair Becker, ex-político e empresário brasileiro, poderia estar gravada na entrada de diversos municípios mineiros, ecoando como um alerta diante da forte dependência econômica da mineração em Minas Gerais.

Ismar Becker
Ismar Becker, empresário, escritor e palestrante | Foto: Divulgação Communica

O conceito descrito por ele está presente no livro “Por que as Nações Fracassam”, dos economistas Daron Acemoglu e James Alan Robinson. A obra busca explicar os motivos pelos quais algumas nações prosperam e outras não. As razões, de acordo com os autores, estão relacionadas ao tipo de instituições econômicas de cada região. Conforme a publicação, existem dois tipos distintos: inclusivas e extrativistas.

A primeira forma de instituição garante ampla participação dos indivíduos na economia e na política, criando um ambiente favorável à inovação, ao empreendedorismo e ao crescimento econômico sustentável. A segunda, por sua vez, refere-se àquela que concentra poder e riqueza nas mãos de poucos, levando frequentemente à exploração dos recursos nacionais sem beneficiar a maioria da população, o que gera desigualdade econômica e social.

Solução para redução da dependência econômica está nos bons exemplos

Na opinião de Ismar Becker, além de iniciativas conjuntas entre empresas e governos, Minas Gerais precisa seguir três pilares essenciais para, de fato, se livrar da maldição das commodities. São eles: entender o que é viável para cada região, do ponto de vista geográfico; respeitar e trabalhar com as vocações e hábitos locais; e contar com um poder público com mentalidade diferente e políticas que incentivem a diversificação econômica.

O empresário cita que “quem não conhece a história está fadado a repeti-la” e que, por isso, é necessário observar o que foi feito de errado para não repetir, assim como identificar boas práticas e replicá-las. A solução, de acordo com ele, está nos bons exemplos, sendo um deles o de sua terra natal: São Bento do Sul, em Santa Catarina.

No município, quando o ciclo da madeira estava se encerrando, em meados da década de 1980, surgiu a alternativa da madeira reflorestada de origem chilena. Entretanto, ninguém sabia trabalhar com ela na região. Na época, a iniciativa privada e a prefeitura local se uniram e criaram uma fundação de ensino e pesquisa, que desenvolveu toda a tecnologia necessária para a secagem, beneficiamento e até exportação da madeira.

Em razão da ação de anos atrás, São Bento do Sul lidera os embarques nacionais de móveis. No entanto, não é dependente da indústria moveleira. Com iniciativas posteriores, setores como o metalmecânico, de plásticos e cerâmica cresceram e tornaram a cidade uma das mais desenvolvidas do País. O case foi apresentado por Ismar Becker no Fórum Regional de Diversificação Econômica (FRDE), realizado em Belo Horizonte, em junho.

Riquezas gastronômicas e culturais ajudam a sair da armadilha das commodities

O gerente executivo do Fórum, Gilmar Barboza, destaca que, em uma edição anterior do evento, surgiu o Movimento Indicações Geográficas de Minas Gerais (IGMG), com o entendimento de que as indicações geográficas (IGs) são grandes impulsionadoras do desenvolvimento econômico e da atividade empreendedora, por valorizarem produtos diferenciados e fortemente associados a um determinado território.

Gilmar Barboza
Gilmar Barboza, gerente executivo do Fórum Regional de Diversificação Econômica (FRDE) | Foto: Divulgação Acervo Pessoal

Atualmente, o Estado possui 24 IGs registradas. Entre elas, estão produtos de dois municípios ainda dependentes da mineração: a Geleia de Pimenta Biquinho de Bento Rodrigues (Mariana) e a Jabuticaba e Derivados de Cachoeira do Campo (Ouro Preto).

Um dos aspectos naturais do movimento, conforme ele, é o “casamento de IGs”, que acontece quando há uma grande concentração de indicações geográficas em uma região que dialogam entre si. Diante disso, podem ser criados roteiros turísticos, eventos gastronômicos, novas embalagens, formatos e receitas, beneficiando a economia local.

A necessidade de diversificar a economia mineira, reduzindo a dependência das commodities de baixo valor agregado e buscando atividades de maior complexidade para aumentar a retenção de valor nas localidades é um dos pilares que norteiam o projeto Parceiros do Futuro, idealizado pelo Diário do Comércio e a consultoria Spine.

NS
José Sana, jornalista, historiador, graduado em Letras, nasceu em São Sebastião do Rio Preto, reside em Itabira desde 1966.

    Mineiros minerando sonhos

    Matéria Anterior
    0 0 votes
    Article Rating
    Subscribe
    Notify of
    guest
    0 Comentários
    Oldest
    Newest Most Voted
    Inline Feedbacks
    View all comments

    Você também pode gostar

    Mais em Cidades