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A Água está sendo homenageada. Não somente em Itabira, mas no mundo inteiro. Se fosse mulher, seria  Miss, ou princesa, mesmo de carruagem quebrada. Se fosse homem seria o Poderoso Chefão,  dos filmes  de números sequenciais. Se estivesse nos Estados Unidos igualaria a um  Kennedy, ou Abraham Lincoln. Na Grécia teria sempre figuras internacionais à sua disposição no estilo de uma Jaqueline Onassis. No Oriente Médio, anti-Bin Laden, ornado de coragem para acabar com o terrorismo. Em Roma, o Papa teria de esforçar para disputar prestígio com ela. Como ponta da prática da  caridade superaria Madre Tereza de Calcutá. Fariam genuflexão a ela como ao Dalai Lama, na Índia. Mas anote no caderninho de apontamentos: só durante esta semana, depois voltaria a ocupar a vaga perene de Maria-Ninguém.

Mesmo bajulada, exposta num pedestal, ou mesmo exibida quando se mostra cristalina ou descendo deslumbrada e feliz em cascatas, ou num andor como se fosse um leitão assado, somente ela sabe de sua saga, que tem passagens desastrosas ao receber todas as sujeiras de indústrias poluidoras; dos detritos como azuis desbotados, chegam para ser ingeridos por ela; dos insultos humilhantes, como se fosse  culpada pela poluição e o desperdício. Olham com desprezo para sua pressão na  saída de mangueiras que lavam passeios, veículos, enfim, a sujeira detestável do mundo. Perdoam-na apenas quem segura  a compressão, mas tratam-na mal como no seguinte exemplo: “A m… de água não entrou na caixa hoje.

 

Em Itabira, a que me propus defender incansavelmente, com unhas e dentes, desde 28 de maio de 1966, Sua Majestade  é  xingada diariamente, como bandida, ou um juiz ladrão no futebol. Vez por outra transferem para o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae) os ataques e, com metralhadora giratória em punho, provocam tiroteios terríveis como um John Wayne, Clint Eastwood, ou Burt Lancaster, super heróis dos filmes faroeste. A Água, maior riqueza do mundo que, se faltar por longo tempo acaba matando todos, não tem espírito vingativo como muitos governos, políticos e ocupantes de cargos públicos.

Os itabiranos  sabem  que foi e é a Vale a grande sugadora de nossa água. Ao assumir o cargo para o qual foi eleito em 2020, o prefeito Marco Antônio Lage tinha conhecimento de que a  mineradora segurava na sua conveniência atraso no cumprimento de  importante item da  Licença Operacional Corretiva (LOC). Hoje são 23 anos de enrolo, empurra-empurra com a barriga e não se sabe o que rola nos bastidores  e  na calada da noite. Reina até hoje a   quietitude   absoluta, ou uma  preguiça institucional.

Marco Lage  garantiu, em discursos e “lives”,  como resolver o problema da água, cujo foco seria a prioridade número um. Mas o tempo passou e nada mudou. Continuamos como nordestinos, na seca alternada com barro. Em dois anos e três meses não tivemos tempo suficiente para saber se foi ou não desferida a  primeira enxadada com vistas à transposição (ou não) de bacias. A maioria dos que participaram das discussões tinha um projeto de menor distância que 21 quilômetros, mas foram votos vencidos. Diplomas, currículos e outras forças ocultas pelo gabarito de participantes da decisão venceram nos debates. Os vencidos se calaram, e esperam e esperam e esperam.

Em cada rincão deste sofrido país e desta complicada Itabira a Água é uma deusa sem cobrar por serviços prestados. Sua Majestade é fonte da vida, quesito indispensável para ser algo divino, garante a certeza de que participou ativamente da criação do mundo e agora sustenta os nossos dias. Aproveitando que continua sendo homenageada, faço um pedido aos fazedores de homenagens e festas: por que não promovem o Mês da Água como fazem com a mulher, as crianças, os namorados?

Ao encerrar, tenho o meu bordão para ela que, aliás, não é de minha autoria, mas que aplaudo como força para a sua autoestima.

 

 

“Enquanto os cães ladram, a caravana passa”.

 

José Sana

 

NS
José Sana, jornalista, historiador, graduado em Letras, nasceu em São Sebastião do Rio Preto, reside em Itabira desde 1966.

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