Lero era apenas lero mas a competência o fez subir patamares na vida. Ele chegou, apenas gastou a lábia e buscou os super leros-leros para a confecção de um invencível marketing
Uma determinação do Criador do Mundo é irrevogável e, então, quer dizer que no planeta Terra tudo pode acontecer, inclusive barbaridades, glórias ou absurdos e coisas inacreditáveis. Como, por exemplo, Lero-Lero ser prefeito de Terra de Ninguém. Foi o fato ocorrido lá pela Idade Média atual. Pode? Ele fez. Ele, Lero-Lero, ou o Baixinho, ou Imperador da Imperatriz da Terra de Ninguém, concedeu entrevista ao Repórter Em Extinção.
José das Graças seria o candidato do Partido Desacreditado do Povo (PDP) e ficou de dar a resposta em convenção. Ocorreu, então, a bomba imprevista: José desistiu, ele ainda vai explicar o porquê. Naquele exato momento, Lero-Lero rodava no seu Buick predileto, indo para a Fazenda Boi Que Não Ri (não confundir com João Que Ri, esta que fornece fubá de milho fino).
Estacionou seu carro na contramão (tudo dele é na contramão) e falou tudo pelo seu magnífico celular que atende de A a Z. O cara é um gentleman.
REE — Como o senhor resolveu ser candidato a prefeito da Terra de Ninguém?
Lero-Lero — Em primeiro lugar, devo dizer que ao me candidatar não foi porque José das Graças havia desistido. Ele já havia dito que não se candidataria pelo fato de eu ter mudado o nome de nossa cidade para Terra de Ninguém. Mudei para mostrar minha força e mostrei. A moda ficou clara e, em pouco tempo, como você está vendo, estamos na terra sem futuro. É este o verdadeiro ideal comunista a que abracei.
REE — E em segundo lugar, qual o seu motivo de entrar para a política?
LELE — Como você sabe, meu pai queria que eu fosse médico, mas, vê lá, veja o meu estilo, sou um verdadeiro Zé das Graças. Trabalhar não é comigo e jamais será. Tanto é que o meu primeiro telefonema foi convidar a Imperatriz para me ajudar. Trata-se de uma figura sabida, energizada, estressada e disposta até a subir mesas para garantir tudo na vida. E nunca mais sairemos da política na nossa Terra de Ninguém.
REE — Existem mais motivos?
LELE — O resto é que tenho a experiência de ter trabalhado numa grande empresa, onde pude ditar para a Imperatriz tudo o que está no meu livro chamado “O amanhã começa ontem”. Aí fiquei anos a fio, muito tempo, depois trabalhei num clube chamado Azul E.C., onde inventei uma revolução em poucos dias e saí imediatamente.
REE — Qual foi a revolução?
LELE — Inventei a TP (Torcida de Papelão), ou seja, não ia torcedor algum no estádio. Mandei comprar caixas de papelão que, à distância, não houve mais a necessidade de gente verdadeira na torcida. A TP deve ficar somente longe do campo de futebol.
REE — Mas o senhor largou o clube muito depressa, não quis lá ficar por quê?
LELE — Aí tive que cair fora porque o Azul virou Merreca E.C; e deixei para meus companheiros os louros da vitória, ou seja, o Cuspe afogou até formiga e mosquito.
REE — E depois?
LELE — Fui trabalhar numa empresa chamada Sol a Pique, onde fui atendido pelo excelentíssimo senhor governador que, dizem, está p… da vida comigo. Ora esta, eu nasci mais inteligente que burro, dei a rasteira quando vi uns babacas da Terra de Ninguém me convidarem para ocupar o lugar de José das Graças.
REE — Como se sente na administração?
LELE — Muito bem, é claro, pois o município quase inteiro me aplaudiu de pé, dando-me quase 80% de votos na segunda eleição. Consegui imitar um político antigo só fincando no centro da cidade uma estátua mixa, menor que os milhares de buracos que não saem nunca das vias. Dizem por aí que caí 26% agora nas pesquisas, mas isso não é perigo para mim, recupero tudo com rebolados e bla-bla-blás, nunca vi um povo que adora mentira como esse daqui, por isso me denominaram Lero-Lero e gostam de mim para sempre. Estarei na frente da Terra até o fim dos tempos.
REE — Como o senhor conseguiu gastar cinco bilhões de reais sem nada fazer?
LELE — O nada fazer é opinião sua, anote aí que vou lhe apresentar um pequeno resumo de façanhas à frente da Terra de Ninguém:
1 — Construí, ou melhor, reformei praças, praçonas e pracinhas num total de umas 45;
2 -— Pintei escadarias como aquela ligando uma rua na outra no centro da cidade;
3 — Pintei paredes de prédios à vontade;
4 — Tapei 1.322 buracos antes das eleições e me tornei duro na queda;
5 — Rocei, cortei, derrubei matos, arbustos e cipós;
6 — Fiz 2.344 festas, festinhas e festanças;
7 — Implantei a ‘corrupção zero’ no terceiro andar inteiro;
8 — Cortei a água de toda a cidade, adiando-a para depois que a Vale for embora;
9 — Prometi preparar a cidade para o futuro e fiz muito mais, pois a entreguei ao passado; 10 — Limpei a cidade e recolhi o lixo, transformando a Central Prometida de Resíduos num dos maiores lixões do Brasil;
11 — Enchi os bolsos dos funcionários municipais e dei-lhes a desesperança de que daqui a meia dúzia de anos, quando a Vale partir para o Norte, cruzarem os braços;
12 — Recuperei o Valeriodoce e vou levar esse time de campeonato de dois meses, com jogadores alugados, à decisão do Campeonato Mundial de Clubes. Quer mais?
REE — Muito bem! Parabéns! Pode candidatar-se a deputado como a Rádio Zap vem anunciando. Vai renunciar e transmitir o cargo ao vice, o senhor Combatente de Demônios?
LELE — Não vou dizer que sim nem que não. Fico com a resposta de um meu marqueteiro de sempre: “Muito antes pelo contrário.”
REE — Obrigado pela gentil atenção.
LELE — De nada, sempre às ordens. Se for para falar bem de mim, fique à vontade. Só detesto quem mete o pau no meu governo e no meu modo de andar ou me chama de Baixinho. A mentira, se falada com critério, não faz mal a ninguém. Como dizem os fascistas, vira verdade.
Zé do Burro, Repórter em Extinção
17/0502025
Imagens: Redes Sociais